O município como escala para o combate ao desmatamento: atores e agendas emergentes
O modelo de desenvolvimento para a Amazônia e o desmatamento da maior floresta tropical contínua do mundo despertam o interesse de múltiplos atores nas escalas local, regional, nacional e global. No Brasil, políticas implementadas a partir de 2004 pelo governo federal, por agentes do mercado e organizações não-governamentais (ONGs) resultaram em uma significativa redução no desmatamento da Amazônia. Nesta tese estudamos o processo de descentralização desencadeado a partir da Lista de Municípios Prioritários para o Controle do Desmatamento (Lista), uma política de priorização das ações de combate ao desmatamento no âmbito federal que levou a agenda do desmatamento para a escala municipal. Focamos no papel das elites locais para entender como políticas que envolvem atores e organizações em diversas escalas de governança interagem com as dinâmicas locais. Analisamos as dinâmicas internas de dez municípios no Pará e Mato Grosso para responder às perguntas: que atores e recursos foram mobilizados na escala local em resposta à Lista, e qual modelo de conservação e desenvolvimento que emergiu desses processos? Adotamos uma abordagem interdisciplinar, ancorada na geografia, mas com elementos teóricos das literaturas de federalismo e descentralização, governança e ecologia política. Utilizamos como fontes de dados entrevistas semi-estruturadas, questionários, observação participativa e dados secundários a partir dos quais examinamos os incentivos para ação, os instrumentos e estratégias adotados, e a composição de atores e organizações na governança implementadas pelos municípios. Nossos resultados mostram que em todos os municípios foi necessária a realização de parcerias com organizações não-estatais para suprir demandas técnicas e financeiras para viabilizar a implementação da agenda da Lista. Os Sindicatos de Produtores Rurais emergiram como importantes espaços de comunicação dentro desses arranjos de governança, e membros das elites locais foram fundamentais para aproximar o setor produtivo de ONGs ambientais. Quatro políticas levadas a cabo por diferentes setores da sociedade e níveis de governança – a Lista, a Moratória da Soja, os Acordos da Carne e o Programa Municípios Verdes do Pará – se reforçaram mutuamente, alavancando a utilização de dados do Prodes/INPE e do Cadastro Ambiental Rural como instrumentos de monitoramento da cobertura florestal. Os arranjos de governança que emergiram dessas políticas fortaleceram as redes entre as elites locais amazônicas, ONGs ambientais, agentes do mercado e o Estado, de modo que os discursos dessas diferentes partes foram convergindo em torno da intensificação da produção. Concluímos que a Lista foi, para atores locais de alguns municípios, uma oportunidade de transformar a imagem do município de “desmatador” para “verde” como forma de alavancar a economia local. Enquanto aderiram ao CAR e ao nãodesmatamento (ao menos em parte), as elites locais negociaram a flexibilização do uso das florestas secundárias e promoveram a intensificação como forma de expandir seus interesses de produção. Embora possa beneficiar um público mais amplo que as elites locais, o modelo de conservação emergente, baseado no binômio floresta x não floresta e na intensificação da produção pecuária e de commodities agrícolas não muda as dinâmicas mais amplas de ocupação da terra na Amazônia.
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UNB [Universidade de Brasilia]
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O modelo de desenvolvimento para a Amazônia e o desmatamento da maior floresta tropical contínua do mundo despertam o interesse de múltiplos atores nas escalas local, regional, nacional e global. No Brasil, políticas implementadas a partir de 2004 pelo governo federal, por agentes do mercado e organizações não-governamentais (ONGs) resultaram em uma significativa redução no desmatamento da Amazônia. Nesta tese estudamos o processo de descentralização desencadeado a partir da Lista de Municípios Prioritários para o Controle do Desmatamento (Lista), uma política de priorização das ações de combate ao desmatamento no âmbito federal que levou a agenda do desmatamento para a escala municipal. Focamos no papel das elites locais para entender como políticas que envolvem atores e organizações em diversas escalas de governança interagem com as dinâmicas locais. Analisamos as dinâmicas internas de dez municípios no Pará e Mato Grosso para responder às perguntas: que atores e recursos foram mobilizados na escala local em resposta à Lista, e qual modelo de conservação e desenvolvimento que emergiu desses processos? Adotamos uma abordagem interdisciplinar, ancorada na geografia, mas com elementos teóricos das literaturas de federalismo e descentralização, governança e ecologia política. Utilizamos como fontes de dados entrevistas semi-estruturadas, questionários, observação participativa e dados secundários a partir dos quais examinamos os incentivos para ação, os instrumentos e estratégias adotados, e a composição de atores e organizações na governança implementadas pelos municípios. Nossos resultados mostram que em todos os municípios foi necessária a realização de parcerias com organizações não-estatais para suprir demandas técnicas e financeiras para viabilizar a implementação da agenda da Lista. Os Sindicatos de Produtores Rurais emergiram como importantes espaços de comunicação dentro desses arranjos de governança, e membros das elites locais foram fundamentais para aproximar o setor produtivo de ONGs ambientais. Quatro políticas levadas a cabo por diferentes setores da sociedade e níveis de governança – a Lista, a Moratória da Soja, os Acordos da Carne e o Programa Municípios Verdes do Pará – se reforçaram mutuamente, alavancando a utilização de dados do Prodes/INPE e do Cadastro Ambiental Rural como instrumentos de monitoramento da cobertura florestal. Os arranjos de governança que emergiram dessas políticas fortaleceram as redes entre as elites locais amazônicas, ONGs ambientais, agentes do mercado e o Estado, de modo que os discursos dessas diferentes partes foram convergindo em torno da intensificação da produção. Concluímos que a Lista foi, para atores locais de alguns municípios, uma oportunidade de transformar a imagem do município de “desmatador” para “verde” como forma de alavancar a economia local. Enquanto aderiram ao CAR e ao nãodesmatamento (ao menos em parte), as elites locais negociaram a flexibilização do uso das florestas secundárias e promoveram a intensificação como forma de expandir seus interesses de produção. Embora possa beneficiar um público mais amplo que as elites locais, o modelo de conservação emergente, baseado no binômio floresta x não floresta e na intensificação da produção pecuária e de commodities agrícolas não muda as dinâmicas mais amplas de ocupação da terra na Amazônia. |
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